Qual é a experiência necessária para se enfrentar um leão?
Li no jornal que o Caetano viria ao Espírito Santo e cismei que teria de falar com ele. Após um mês tentando contato direto com a produção do mesmo, recebemos um sim. A Sandra Sato topou a aventura, enquanto cinegrafista, e o Ivanildo foi designado como motorista, que, improvisadamente, virou fotógrafo.
O combinado era fazer a chamada olhando para câmera no momento em que a porta se abrisse. O tempo foi justo e ele veio todo sorridente. Mas, quando cruzei olhares com o Caetano (sim, o Veloso), a conexão foi imediata e fiquei impossibilitada de retomar qualquer outra lente que não fosse aquelas do baiano à minha frente.
A conversa fluía maravilhosamente, quando percebi certa irritação do cantor com algumas perguntas da outra repórter que também o entrevistava. Eu já estava nervosa e fiquei ainda mais. Além de apreciar o trabalho do artista, tinha estudado para aquele momento e sabia o que gostaria de perguntar. Sentia conversar com ele, até que, por um descuido verbal, fiz uma besteira…
Bem, você sabe que as palavras podem ferir, não? Escrever ainda dá tempo de apagar e refazer. Entretanto, quando é falado, quase não há tempo de se consertar o que saiu “errado”. Queria ter dito “… e o rock deste novo disco?” mas saiu “…e este novo rock?” Sentiu a diferença?
Veloso responde muito melhor do que poderia imaginar. No final, “sutilmente”, corrige minha falha. Até tentei retificar antes, mas já era tarde. O tempo estava se esgotando, mas, ainda assim, pedi uma foto. E, em um rápido bate-papo, Caetano fez um elogio pela entrevista e um pedido de cópia da mesma. Estiquei ao céu e voltei para terra imediatamente. Acorda! Ainda bem que meus pés permanecem no chão.
O trio estava em êxtase. Voltamos com um leão para a TV Universitária. Sim, éramos duas estudantes e um funcionário que a instituição disponibilizou para nos levar. Experiência, enquanto entrevistadoras de televisão, não fazia parte do nosso currículo, mas força de vontade, sim. Fomos assuntos na faculdade, recebemos, e ainda recebemos, elogios pelo feito.
A não ser no Canal Universitário, nunca divulguei a entrevista. Embora seja um arquivo, uma conversa com Caetano Veloso é sempre uma aula de cultura. Hoje, depois de assistir pela primeira vez a um show “ao vivo” de Caetano (neste caso com Gilberto Gil na Concertgebouw, em Amsterdam), publico o vídeo, e aproveito para escrever o que gostaria de ter dito ao cantor, oito anos atrás:
— Caetano, desculpa por ter posicionado a palavra “novo” no lugar errado da frase. Obrigada pelo aprendizado e, acima de tudo, por mostrar minha falha, ainda que os outros nem a tenham percebido.
(Junho de 2015)
Foto: Edsandra Carneiro
Clique, abaixo, e assista a entrevista: